Ao assistir à reportagem “Linha do Tempo”, senti saudade
da Maria Fumaça.
Voltei no tempo e virei criança novamente. Relembrando o
tempo em que ela passava em Cambuquira. Quando apitava na
curva, junto com outras crianças, corríamos para a beira da linha
para vê-la passar. Eu subia em cima do barranco, pois sentia
medo dela. E lá vinha, baforando fumaça e badalando o sino
vagarosa para chegar à estação. Exótica, poderosa, bonita, africana,
passava ventilando, emocionando, agitando nossos cabelos.
Abanávamos as mãos para os passageiros. Eu gostava também de
ir à estação, ver o movimento. Era no tempo do turismo.
Lá estava Euclides, um jovem elegante de família tradicional.
Homens e mulheres vestiam- se à moda da novela Chocolate
com Pimenta! Ele vestia terno escuro e camisa branca,
chapéu copa alta e gravata preta de laço. Elizabete chegava elegante,
com seu chapéu enfeitado com flores combinando com
o vestido, acompanhada de Tia Lídia. Moravam em Lambari.
Euclides tirava o chapéu, respeitoso, e beijava suas mãos.
- Que saudade de minha princesa, de meu amor, que fica
longe de mim.
- Euclides, eu te amo, não vejo a hora de nos casarmos.
E beijavam- se.
Tia Lídia gostava de passear no Parque das Águas de manhã.
Ficar entre os jardins, ouvindo os pássaros e lendo seu
romance preferido de José de Alencar: Iracema, a Virgem dos
Lábios de Mel. Enquanto Euclides e Elizabete se amavam naquele
caramanchão junto ao lago e à mata.
- Que delícia este retiro de amor!
Os turistas tirando fotografias e fotografando as belezas de
Cambuquira. Tia Lídia voltava para Lambari levando coisas
boas daqui. Queijos, doces, artesanatos e outros...
Na estação tia Lídia dizia:
- Que vontade de ficar morando aqui!
- Seria tão bom - dizia Euclides-, não ficaria longe de meu
amor.
- Já se aproxima a hora de irmos para o altar, amor. Dizia
Elizabete com olhos lacrimejando.
Quando Maria Fumaça chegava à estação era só alegria! O
Juca com seu enorme buquê de bexigas coloridas assanhando
a criançada. O Carlos pipoqueiro, o Ernesto do cachorro quente,
o nordestino Agenor com seu realejo e o periquito da sorte.
Era aquele movimento. Maria Fumaça dava o apito de partida,
baforando fumaça como se estivesse com pressa, ia saindo, dizendo
assim:
- Café com pão, café com pão... como dizem os versos do
poeta Manuel Bandeira, inspirados nela. Ela dobrava a curva
do Pico- Paco. Ia rodar sertão, mostrando aos passageiros as
belezas e as riquezas de Minas Gerais.
Despertei-me e cresci novamente! Foi um sonho. Quando
eu me lembro dela, junto com a saudade, ouço seu apito na
curva, fumaça expelindo para o céu, com o sino badalando e
declamando:
- Café com pão, café com pão...
De dia e de noite, chegando à estação, a imortal Maria Fumaça
que só na lembrança passa.
HILDA URBANA DA SILVA
Fonte: Jornal Encontro.
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